Aviação privada é responsável por 40% dos acidentes aéreos no Brasil desde 2011; táxi aéreo responde por menos de 7%
Mais de 40% dos 1.824 acidentes aéreos no Brasil registrados desde 2011 ocorreram com aeronaves particulares, mostram dados do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).
O avião que caiu na sexta-feira (5) e matou cinco pessoas, entre elas a cantora Marília Mendonça, era de uma outra categoria — táxi aéreo. Um total de 6,35% dos acidentes no período ocorreram em aeronaves que prestam esse tipo de serviço, segundo o Cenipa.
Em contrapartida, a chamada aviação regular — ou seja, voos comerciais para transporte de passageiros feito pelas companhias aéreas — responde só por 0,87% dos acidentes registrados no período.
Na aviação regular, foram apenas 16 ocorrências do tipo de 2011 para cá — o último acidente fatal do Brasil nessa categoria ocorreu há mais de 10 anos, na queda de um avião da NOAR Linhas Aéreas em Recife, quando 14 passageiros e dois tripulantes morreram.
Os dados do Cenipa incluem aviões, helicópteros, ultraleves, dirigíveis e outras aeronaves.
- Aviação particular: é o uso da aeronaves em viagens privadas — a pessoa tem um avião ou um helicóptero e pode usá-lo para viajar. Não pode, no entanto, cobrar para levar alguém; pode só fazer transporte próprio, de familiares ou de amigos.
- Táxi aéreo: é feito por empresas de aviação contratadas para levar uma pessoa ou um grupo de um lugar para o outro — ou seja, há uso comercial. Deve seguir uma série de exigências mais rígidas sobre treinamento de pilotos e manutenção do que a aviação particular.
- Aviação regular: são os voos das companhias aéreas, marcados com um número, que fazem transporte entre os aeroportos em um horário e uma linha pré-definidos.
Os especialistas ouvidos pelo g1 pedem cautela em relação a esses números: afinal, cada acidente é único e demanda análise profunda para estabelecer qualquer tipo de relação de causa e consequência. Eles dizem também que a aviação geral brasileira é, sim, segura, mas que os níveis de segurança podem sempre ser aprimorados e melhorados.
Além disso, a discrepância se explica em parte pela enorme diferença numérica entre aeronaves particulares, que chegam a 47% do total, sobre os aviões comerciais, que são apenas 3%, segundo dados de 2020 da Anac. Serviços de táxi aéreo respondem por 6% do total. Ou seja, são percentuais próximos dos observados na proporção dos acidentes por segmento da aviação.
“A capilaridade é muito maior na aviação particular. Tem avião que voa de uma fazenda para a outra”, exemplifica George William Sucupira, conselheiro da Associação de Pilotos e Proprietários de Aeronaves (Aopa)
Vale lembrar que as causas do acidente que matou Marilia Mendonça e mais quatro pessoas ainda estão sob investigação. Documentos mostram que a aeronave acidentada perto de Caratinga (MG) estava habilitada para o serviço de táxi aéreo — que era, de fato, a categoria do voo que levava a cantora.
Ainda assim, a fiscalização dos voos privados levanta mais preocupações. Veja abaixo por quê.
Categorias diferentes, exigências diferentes
Primeiro, é preciso entender que todas as aeronaves devem seguir uma série de normas e estar em dia com as documentações para poder levantar voo. Isso vale tanto para equipamentos comerciais regulares quanto para táxi aéreo e aviões particulares.
“Todo avião tem que fazer a inspeção anual de manutenção em uma oficina homologada. Sem isso, um avião não consegue fazer o voo e é suspenso”, afirma George William Sucupira, conselheiro da Associação de Pilotos e Proprietários de Aeronaves (Aopa).
No entanto, as companhias aéreas e as empresas de táxi aéreo passam por ainda mais etapas de checagem, com uma fiscalização bastante rígida, no Brasil, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Diferenças entre táxi aéreo e aviação privada
Táxi aéreo | Aviação privada | |
Avaliações do treinamento dos pilotos | Mínimo de 3 por ano | Anual ou bienal |
Avaliações da saúde dos pilotos | Anual | A cada 5 anos |
Experiência profissional exigida | 500 horas de voo e 1,2 mil horas à noite ou sob chuva | 40 horas |
Equipamentos de segurança | Exige adicionais para aumentar a segurança | Padrão |
Exigência de seguro | Para passageiros e bagagem | Só para passageiros |
Equipe | Precisa de profissionais para segurança, manutenção e coordenação | O piloto muitas vezes faz as 3 atividades |
Monitoramento de segurança pela Anac | Tem | Não tem |
Essa diferença de critérios para cada tipo de serviço precisa ser seguida à risca — e há fiscalização da Anac. Em 2018, num outro caso completamente diferente do ocorrido na semana passada, um outro avião que levava a mesma cantora Marília Mendonça precisou ser desviado porque a empresa dona daquela aeronave não estava homologada para o táxi aéreo na ocasião.
Então, por que o setor da aviação privada preocupa mais? O diretor de segurança do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Eduardo Antunes, aponta as seguintes razões:
- Aeronaves menores nem sempre pousam ou decolam de grandes aeroportos com estrutura de ponta para pousos e decolagens em condições adversas;
- As exigências da Anac para avaliações periódicas, como visto na tabela acima, são menores na comparação com os critérios do táxi aéreo e, mais ainda, na aviação comercial regular;
- Os procedimentos de manutenção são muito custosos, então nem sempre um proprietário de aeronave particular terá condições financeiras de arcar com revisões além das obrigatórias.
Outro problema é que alguns pequenos operadores ou donos de avião burlam as regras e forjam documentos — o que também estaria por trás de uma série de acidentes na aviação particular, apontam relatórios finais de investigação pelo Cenipa.
“Se você for olhar o relatório de acidentes, dá para ver que são problemas relacionados com manutenção, maus hábitos e treinamento”, explica Antunes.
Fonte; G1
Foto: Carlos Eduardo Alvim/TV Globo