Em audiência com deputados e Seduc, CPERS reforça que não há segurança para voltar às aulas presenciais
Os desafios e as consequências da retomada das aulas presenciais motivaram a audiência pública realizada na manhã desta terça pela Comissão de Educação da Assembleia Legislativa, com a presença de deputados(as), entidades e Seduc.
Representando o CPERS, as diretoras Sônia Solange Viana e Vera Lessês ressaltaram a posição do sindicato: no cenário atual não há qualquer segurança para educadores(as) e estudantes retornarem às escolas, mesmo que parcialmente.
Sônia, que coordena o Departamento dos Funcionários de Escola, destacou o número insuficiente de servidores(as) e a falta de treinamento e equipamentos para realizar a higienização recomendada pelos órgãos de saúde.
“A maioria das escolas públicas tem estruturas precárias. Não há sequer papel higiênico, quem dirá álcool em gel. Para seguir os protocolos recomendados, de limpar os ambientes a cada duas horas, será preciso um número maior de funcionários. Como o governo vai dar essa garantia se já contamos com uma falta significativa desses profissionais?”, questionou.
“Recebemos o relato de 40 escolas que evidenciaram a falta de 76 professores e 72 funcionários para a limpeza e a merenda. Isso é uma pequena amostra, pois precisamos considerar que muitos profissionais ficarão afastados por integrarem o grupo de risco”, frisou a deputada Sofia Cavedon, presidente da Comissão de Educação.
“Tem escolas em que de manhã um funcionário usa uma bota e à tarde outro funcionário usa a mesma. A maioria não tem sequer avental”, relatou Sônia sobre a falta de equipamentos.
Vera, que coordena o Departamento de Saúde do Trabalhador do CPERS, comentou o sistema sugerido pelo governador nesta segunda-feira (18). Eduardo Leite propôs que os estudantes que não tenham como acessar a Internet mesmo com a contratação de um plano de dados por parte do Estado tenham aulas em modalidade presencial.
“Estamos angustiados com essa possibilidade. Somos favoráveis ao retorno somente quando a OMS e pesquisadores assegurarem que a pandemia está sob controle. Ainda assim, qualquer possibilidade de trabalho presencial passa pela garantia de equipamentos de proteção individual tanto para professores quanto para funcionários e estudantes.”, afirmou.
CPERS cobra explicações do governo
Ainda pela manhã, o CPERS enviou ao governo um ofício pedindo informações detalhadas quanto aos protocolos sanitários e parâmetros pedagógicos de retorno às aulas, destacando a importância da segurança de educadores e estudantes.
O documento também questiona de que forma será garantido o acesso às aulas domiciliares para todos os estudantes, e como será suprido o suporte metodológico e de formação de educadores.
O sindicato também indaga o posicionamento do governo quanto à realização do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem, em meio à pandemia. O CPERS e entidades estudantis de todo o país defendem o adiamento da prova.
Diretor da Seduc afirma que não há previsão de retorno das aulas presenciais
O diretor geral da Secretaria Estadual de educação (Seduc), Paulo Magalhães, afirmou que ainda não há previsão de retorno às aulas. “Estamos preocupados tanto com os alunos quanto com os professores. Podem começar as aulas e depois de alguns dias, se tiver alguém com febre, teremos que suspender novamente. Por isso, não há previsão de retorno por enquanto”, disse.
Ao mesmo tempo afirmou que o secretário de educação, Faisal Karam, já estuda modelos de equipamentos de proteção e protocolos. “Existe o ideal e o que pode ser feito. O impacto financeiro é em torno de R$ 600 milhões para a aquisição dos materiais”.
Encaminhamentos
Ao final da reunião ficou definido que será estruturada uma Comissão Pedagógica Multidisciplinar, com a representação de todas as entidades presentes na reunião, para conversar com a Seduc. “Vamos buscar uma reunião desta comissão com a Secretaria, pois precisamos saber, por exemplo, como ficará o trabalho dos professores em junho”, afirmou Sofia.
Para Conselho de Educação, retomada é inviável no momento
Marcia Adriana de Carvalho, presidente do Conselho Estadual de Educação, também pontuou que retomar as aulas neste momento não é seguro. “Neste momento é inviável. Temos que olhar para o exemplo da França, que abriu as escolas dia 11 de maio e agora está suspendendo novamente. Mesmo com número reduzido de estudantes circulando houve o aumento do contágio após a abertura das escolas. A prioridade é o cuidado. Entendemos que neste momento as atividades não presenciais não são o ideal, mas o possível para garantir o vínculo pedagógico com os alunos.”
Ela lembrou também que antes da pandemia tomar a dimensão atual, o Conselho já havia apresentado para as mantenedoras das escolas a possibilidade de dar continuidade do vínculo pedagógico das instituições com suas comunidades escolares, mediado pelas famílias.
Distanciamento e enturmações: cenário impraticável
Gê Minhos, da União Gaúcha dos Estudantes Secundaristas (UGES) questionou como o governo poderá garantir o distanciamento indicado por especialistas diante das enturmações. “Temos turmas superlotadas, resultado das enturmações. Como faremos o distanciamento?”, indagou.
Ele também expôs preocupação com a falta de estrutura e profissionais. “O número de funcionários já é muito abaixo. Como vão fazer a higienização adequada para termos o mínimo de segurança? E os estudantes do grupo de risco? Vai ter uma atenção especial para eles? Outra questão é que muitos alunos não terão como fazer a troca de duas ou três roupas, conforme preveem os protocolos”, avaliou.
Impossível prever os riscos aos nossos filhos neste momento
Clarissa Maria Aquere, do grupo de Mães pelo Direito ao Ensino não Presencial durante a pandemia e professora das redes estadual e municipal, colocou a preocupação com os riscos de contaminação das crianças e das famílias.
“Não temos certeza de nada neste momento. O Brasil é o país que tem mais mortes de crianças no mundo todo, de acordo com estudos divulgados essa semana. Além de se infectarem, podem levar o vírus para casa e contaminar a família. Ninguém perguntou como pais e professores sentem-se ao retomar as aulas”, disse.
“Não é só ter álcool ou classes distantes umas das outras. Em uma escola estadual como a que atuo, com 1200 alunos, não vejo como evitar que crianças e adolescentes se toquem. É muito perigoso o retorno neste momento. Tenho alunos que me dizem todos os dias que estão com medo de voltar”, observou.
Aline Kerber, da Associação Mães e Pais pela Democracia, relatou que, recentemente, foi entregue ao governador uma carta da associação com mais de 5 mil assinaturas. “Mães e pais de mais de 200 escolas privadas e públicas assinaram pedindo o não retorno presencial neste momento. É preciso investir mais em aulas a distância, principalmente para a rede pública, e nos protocolos para que se tenha um retorno seguro e controlado para a segurança de todos”, afirmou.
Modelo de retorno tem que ser pactuado com a comunidade escolar
O professor Carlos Abicalil, membro da Coordenação Nacional dos Encontros de presidentes e vice-presidentes das Comissões de Educação das Assembleias Legislativas, apresentou o cenário do debate nacional sobre a possibilidade de retorno das aulas presenciais.
“Há uma desigualdade enorme entre a estrutura de acesso dos alunos de escolas públicas e privadas. Segundo dados de um estudo de 2018, 58% dos domicílios brasileiros não têm um computador. Para garantirmos o direito universal à educação a todos os estudantes deveríamos ter as mesmas condições e capacidades.”
Para ele, não há como fazer um retorno seguro sem a ampliação das medidas de segurança necessárias. “Mais contratação de profissionais e protocolos que prevejam o que fazer quando for identificada uma contaminação. E não há como ter modelo de retorno pactuado sem ouvir a comunidade escolar, pois quem estará no front dessa situação serão os professores e as famílias”, considerou.
O envelhecimento da categoria no Rio Grande do Sul é outro fator de risco que, segundo Abicalil, deve ser considerado para o retorno às aulas presenciais.
FONTE E FOTO: ASCOM CPERS