O governador Eduardo Leite chega à véspera da votação do pacote do funcionalismo ainda tentando obter a adesão do maior partido na Assembleia Legislativa. Com oito deputados e disposto a adiar parte dos projetos para janeiro, o MDB terá papel decisivo na reforma do Estado proposta pelo tucano. Uma reunião com a bancada emedebista, marcada para o final da tarde desta segunda-feira (16), no Palácio Piratini, poderá selar o êxito ou o fracasso da empreitada governista.
O objetivo de Leite é votar as sete matérias do pacote entre terça (17) e quinta-feira (19), deixando para 2020 apenas a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que aumenta idade mínima e tempo de contribuição para aposentadoria dos servidores. Essa pressa incomoda vários aliados. Além do MDB, PTB, PSB e PP já pediram mais tempo.
O almoço de quinta-feira, no qual o governo amenizou algumas medidas, serviu para diminuir as resistências, sobretudo no PP. Com seis parlamentares, a bancada se sentiu mais confortável para votar os projetos a partir do aumento nas faixas salariais do magistério. Nos bastidores, o partido garantiu fidelidade ao Piratini, mas assim como outros aliados, está cioso do protagonismo exercido pelo MDB na reivindicação de mais vantagens aos servidores. As legendas querem evitar a impressão que estão aderindo de forma inconteste ao plano do governo, enquanto os emedebistas se reaproximam do funcionalismo.
— Não estamos dizendo que não vamos votar, nem condicionando. Mas não estamos completamente satisfeitos — diz o líder da bancada do PP na Assembleia, Sérgio Turra.
No PTB, a postura é semelhante. Entre os cinco deputados, há três mais refratários à disposição de Leite em votar tudo nesta semana: Kelly Moraes, Dirceu Franciscon e o líder Aloísio Classmann. O próprio presidente da Assembleia, Luis Augusto Lara, já manifestou publicamente o desejo de adiar a votação.
Embora a legenda tenha o vice-governador, Ranolfo Vieira Júnior, os deputados reclamam da pequena participação no governo. Em conversas privadas, alguns parlamentares sustentam que o número de cargos na burocracia estatal, considerado baixo em relação aos concedidos ao MDB, por exemplo, não compensa o desgaste eleitoral de votar medidas amargas.
Peso
Apesar dos descontentamentos esparsos se alastrarem por outros partidos aliados, há no Piratini a convicção de que o MDB será a locomotiva da votação: tanto pode puxar a composição governista, como deixar tudo empacado nos trilhos. Daí o tratamento diferenciado conferido à legenda, com reunião exclusiva no gabinete do governador na véspera da apreciação dos projetos.
Das sete matérias do pacote, seis são projetos de lei complementares (PLCs), o que exige voto favorável de pelo menos 28 deputados. Sabendo do peso que terá nas votações, o MDB chega para a reunião com Leite com pouca disposição a fazer concessões.
Uma das principais reivindicações é a criação de uma regra de transição na transformação das vantagens e adicionais por tempo de serviço em parcela autônoma. Outra exigência é que o dinheiro para o reajuste ao magistério prometido por Leite em 2021 e 2022 não seja retirado da parcela autônoma.
Antes do encontro com o governador, previsto para às 18h, a bancada fará uma reunião interna, às 15h. A ideia é fechar questão em torno de pontos considerados incontornáveis e mostrar unidade a Leite.
— A assessoria da bancada está analisando as mudanças e estou falando com os deputados. Vamos nos reunir antes e tirar uma posição. Melhorou a tabela de salários dos professores, mas se o aumento sair da parcela autônoma não tem jeito – salienta o líder do partido, Fábio Branco.
Urgência
O governador tem insistido que não há mais margem financeira para flexibilizar o pacote. Ele também sustenta que as mudanças precisam ser aprovadas com urgência, sobretudo para ter reflexo no caixa do Estado e facilitar a adesão ao regime de recuperação fiscal da União.
Leite quer insistir com as votações nesta semana porque está convicto de que nada garante uma aprovação mais tranquila em janeiro, durante convocação extraordinária da Assembleia.
Entidades da área de segurança se mobilizam
Lideranças de entidades das forças de segurança do Estado prometem mobilizações a partir desta segunda-feira em protesto contra a votação do pacote do funcionalismo na Assembleia Legislativa. As manifestações devem envolver policiais civis e militares, bem como familiares dos servidores, na Capital e no Interior.
De acordo com o presidente da Associação dos Oficiais da Brigada Militar, coronel Marcos Paulo Beck, um grupo permanecerá os próximos dias concentrado na Praça da Matriz, em frente ao Palácio Piratini e à Assembleia. O objetivo é pressionar o governo a retirar os textos ou, em última etapa, convencer os deputados a derrubarem as propostas.
Na Associação dos Sargentos e Tenentes da Brigada Militar, os dirigentes fazem segredo sobre a estratégia de mobilização da categoria. Mulheres e parentes dos servidores, contudo, se organizam para tentar bloquear os portões dos quartéis a partir da manhã desta segunda-feira, impedindo a saída dos brigadianos para ações de rua.
– Ou o governo retira o pacote ou não voltamos à normalidade – condiciona o secretário da entidade, sargento Ricardo Agra.
Na Polícia Civil, o Sindicato dos escrivães, inspetores e investigadores da Polícia Civil do Rio Grande do Sul (Ugeirm) está convocando paralisação a partir desta segunda-feira. Diante dos protestos, os sindicalistas orientam a população a registrar ocorrências de menor gravidade na Delegacia Online. Flagrantes, homicídios, latrocínios, estupros, ocorrências envolvendo crianças e adolescentes e Lei Maria da Penha continuarão sendo registradas nas delegacias físicas
A chefe da Polícia Civil, delegada Nadine Anflor, afirma que os serviços vão se manter dentro da normalidade. Segundo ela, não há, por parte da chefia, orientação de restrição de atendimento à população:
– Sabemos que será uma semana difícil, de votação dos projetos, mas os serviços seguem normais.
O Pacote de Leite
Previdência Civil – PLC 503/2019
Principais mudanças: isenção dos inativos será restrita a quem ganhar no máximo um salário mínimo nacional (R$ 998). Quem receber entre R$ 998 e R$ 5,8 mil pagará 14%. Salários até R$ 20 mil pagam 14% sobre R$ 5,8 mil e alíquota de 16% sobre o que exceder. Quem ganhar mais de R$ 20 mil pagará 14% sobre R$ 5,8 mil, 16% sobre o restante até R$ 20 mil e 18% sobre o que exceder R$ 20 mil.
Votos necessários para aprovação: 28
Previdência Militar – PLC 504/2019
Principais mudanças: isenção dos inativos será restrita a quem ganhar no máximo um salário mínimo nacional (R$ 998). Quem receber entre R$ 998 e R$ 5,8 mil pagará 14%. Salários até R$ 20 mil pagam 14% sobre R$ 5,8 mil e alíquota de 16% sobre o que exceder. Quem ganhar mais de R$ 20 mil pagará 14% sobre R$ 5,8 mil, 16% sobre o restante até R$ 20 mil e 18% sobre o que exceder R$ 20 mil.
Votos necessários para aprovação: 28
Estatuto dos servidores PLC 505/2019
Principais mudanças: inclui teletrabalho, possibilidade de redução da jornada de trabalho, mediante acordo entre o funcionário público e a sua chefia e a revisão do pagamento de diárias e do abono família, entre outros itens.
Votos necessários para aprovação: 28
Estatuto dos militares – PLC 506/2019
Principais mudanças: estabelece o pagamento por subsídio, unificando todos os apêndices salariais. Os valores começam pelo soldado de nível três, com R$ 4.689,23, e chegam ao comandante-geral e ao coronel, com R$ 27.919,16.
Votos necessários para aprovação: 28
Estatuto do magistério – PL 507/2019
Muda o plano de carreira do magistério, estabelecendo subsídios para as classes e os níveis dos professores estaduais. Os valores variam de R$ 2.717,15 a R$ 4.752,42.
Votos necessários para aprovação: metade dos deputados presentes mais um, sendo que ao menos 28 precisam estar em plenário
Estatuto do IGP – PLC 508/2019
Estabelece o pagamento de subsídio aos servidores do Instituto-Geral de Perícias (IGP)
Principais mudanças: estabelece o pagamento de subsídio, unificando todos os apêndices salariais. Os valores oscilam de R$ 4.647,76 (técnico em perícias primeira classe) a R$ 18.442,54 (perito criminal especial e perito médico-legista especial).
Votos necessários para aprovação: 28
Aposentadoria especial – PLC 509/2019
Principais mudanças: implementa paridade e integralidade da aposentadoria dos policiais civis e dos agentes penitenciários que ingressaram entre 2003 e o início da previdência complementar, em 2016. Há regras de transição, com cumprimento de período adicional de contribuição.
Votos necessários para aprovação: 28
PEC da Previdência – PEC 285/2019*
Principais mudanças: extingue pagamento de gratificações e adicionais por tempo de serviço, veda da incorporação de função gratificada, aumenta idade e tempo de serviço para servidores civis e militares.
Votos necessários para aprovação: 33 votos em dois turnos, com quórum minímo de 34 deputados
* Votação só ocorrerá em janeiro, em convocação extraordinária da Assembleia
Fonte e foto: Gaúcha ZH