As quase 100 milhões de toneladas de milho colhidas na safra brasileira 2018/2019 não são a única marca histórica registrada pelo grão neste ano. Os embarques internacionais de milho, excluindo aquele destinado à semeadura, por exemplo, mais do que dobraram entre janeiro e outubro de 2019 no comparativo com o mesmo período de 2018.
Pelos portos brasileiros saíram 34,7 milhões de toneladas neste ano, ante 15,6 milhões no ano anterior- um crescimento de 122%, de acordo com dados do Comex Stat, sistema de estatísticas oficiais de comércio exterior do Ministério da Economia. Em valores, as exportações já somam US$ 5,92 bilhões.
Uma das razões para a alta tão expressiva é a demanda mundial por ração animal, já que o milho é um dos principais insumos para criadores de aves e suínos e o mercado exportador de carnes vive um momento de fortes vendas para a China. Com isso, o Brasil se encarregou de alimentar boa parte dos planteis estrangeiros. Como a China precisou eliminar milhares de animais devido a Peste Suína Africana (PSA) que se alastrou pelo país desde 2018, o gigante asiático passou a importar ainda mais frangos e suínos de outros países para abastecer a população.
Apesar de o Brasil também estar demandando mais milho – especialmente em estados com o Rio Grande do Sul, que ampliou os embarques de carnes para o mercado chinês – o elevado número de exportação não é apontado como um fator negativo. Mais liquidez para a venda estimularia o plantio e ajudaria manter os preços estáveis, mesmo em uma ano de supersafra, o que normalmente tende a baixar os valores pagos ao produtor. “As exportação são benéficas, em geral. Ajudam a regular melhor os preços e estimulam a produção interna”, sintetiza o economista da Farsul, Antônio da Luz.
Rafael Ribeiro, analista da Scot Consultoria, destaca que os preços futuros do grão estão em alta e assim devem seguir por algum tempo. Uma das razões são os estoques nacionais em baixa. De acordo com Ribeiro, a Conab já trabalha com projeção de que os estoques brasileiros fiquem próximo de 11 milhões de toneladas em breve, ante uma média histórica entre 13 milhões e 14 milhões de toneladas. “Com isso, os preços futuros para janeiro de 2020 estão em R$ 48 a saca, na cotação de Campinas, que baliza os valores na B3. Em janeiro de 2018, estavam entre R$ 30 e R$ 31 para o mesmo período de 2019”, destaca o analista.
Ribeiro também ressalta que os bons preços do milho devem se manter em 2020 devido ao fato de que dificilmente se registrará produção e uma produtividades tão altas no milho quanto as obtidas neste ano. O analista explica que por questões climáticas que levaram ao atraso na semeadura da soja em 2019 o plantio de milho também será postergado. Com consequentes riscos maiores para o desenvolvimento das lavouras, que poderiam ser cultivadas fora das janelas ideais de plantio.
Porto do Rio Grande também registra expansão dos embarques
Mesmo com déficit histórico de 1 milhão de toneladas para alimentar aves e suínos em criatórios gaúchos, o Rio Grande do Sul também exportou quantidades expressivas de milho em 2019. Ainda que boa parte do que sai pelo Estado seja produzido na Região Centro-Oeste, os dados do porto gaúcho chamam a atenção.
De acordo com o setor de estatística do porto do Rio Grande, os embarques de milho a partir do Rio Grande do Sul somaram 487 mil de toneladas entre janeiro e outubro deste ano. É o maior volume dos últimos cinco anos, superando significativamente o último recorde, de 385,7 mil toneladas embarcadas ao longo de todo o ano de 2015.
O déficit médio de milho no Estado, que era de cerca de 1 milhão de toneladas, neste ano, pode chegar a 1,4 milhão, mesmo com o aumento da produção do grão por aqui, diz José Eduardo dos Santos, diretor-executivo da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav). “O que estamos fazendo é comprar ainda mais de fora, e até do Paraguai, que não é um tradicional fornecedor, para suprir essa lacuna, mesmo arcando como alto custo de frete”, explica Santos.
De acordo com presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, o Brasil teve, em 2019, a “grande sorte” de colher uma grande safra. Isso porque, de acordo com o executivo, nos últimos 10 anos, cinco foram de escassez do grão para abastecer o mercado interno. “Na Câmara Setorial do Milho, um dos principais debates é sobre como estimular a produção nacional. Uma das propostas é incrementar os contratos de aquisição futura. Isso ajudaria o setor a ter previsibilidade maior, e o produtor teria a certeza de que venderá e por quanto”, explica Turra.
Para o economista da Farsul, Antônio da Luz, o milho no Estado está em patamar elevado, mas ainda pode ter crescimento pela necessidade de rotação de culturas. Porém, o grão tem custo de produção elevado e maior possibilidade de perdas por problemas climáticos do que a soja, por exemplo. “E a produção do milho depende do preço da soja. Quanto mais alto o preço da soja, menos disposto fica o produtor a semear milho. Com a soja nos atuais patamares, fica difícil ver uma ampliação mais robusta na área cultivada”, analisa Luz.
Fonte e foto: Jornal do Comércio/RS